Como jornalista, sinto um certo constrangimento (o que aprendi a chamar de "vergonha alheia") toda vez que pego uma dessas publicações de bairro. São jornais, revistas e boletins que, em geral, desperdiçam a rica oportunidade de estabelecer uma comunicação mais direcionada e comunitária e que se prezam a anunciar produtos e serviços de estabelecimentos da região.
Que isso ocorra nas peças publicitárias e nas seções de classificados, vá lá. O problema é que as publicações fazem propaganda disfarçada na área editorial, em artigos e reportagens. Claro que o leitor comum não tem obrigação de saber como o jornalismo separa e organiza suas seções. Mas ele sabe diferenciar um anúncio publicitário de um texto informativo, sim.
Ou seja, quando lemos uma reportagem que fica linhas e mais linhas dizendo os benefícios e as vantagens da loja tal, surge essa vergonha alheia e a inevitável pergunta: quanto será que o dono pagou para ocupar esse espaço?
Mesmo assim, folheei uma revista do meu bairro neste fim de semana, correndo todos os riscos de encontrar alguma frustração. Mais do que isso, fiquei foi chocada com uma reportagem apresentando um novo centro de compras recém-inaugurado, com restaurantes, lojas de roupas, mercado de comida natural etc.
Entre uma expressão elogiosa e outra, o texto explicava que aqueles 'street malls' eram tendência e que nos Estados Unidos eram uma experiência consagrada. Dizia que tinham surgido para substituir as antigas pracinhas, com a "vantagem de ser um lugar de consumo, além de espaço de convivência e encontros, já que as praças foram suprimidas com o crescimento das metrópoles".
Aquilo me deprimiu. Quem teria tido a coragem de escrever aquele absurdo? Lógico que não sou contra o comércio; trabalho numa instituição mantida por ele e posso me considerar resultado dele, porque meus pais se conheceram trabalhando com venda de sapatos. Mas o comércio nunca, jamais, substituirá os espaços públicos (e mesmo os privados) de convivência. Aqueles lugares para onde vamos para simplesmente não fazer nada, a não ser jogar conversa fora, observar e contemplar as relações humanas e a natureza.
As praças não foram suprimidas pela urbanização. Seguem vivas e determinantes para as boas relações entre nós, seres humanos (e carentes). Nós nos constituímos no contato e na troca com o outro. E não precisamos de intermediários_ especialmente quando este for o consumo.
Ainda bem que existem muitas pessoas que acreditam nos espaços públicos e que procuram ocupá-lo sempre. Eu sou uma delas. Façamos das praças os nossos quintais. E deixemos para os shoppings e street malls a função primária para os quais foram criados.
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